sábado, abril 01, 2006

CONVERSA AMENA


(CONTO)

Manuel Pedro Pereira, Jr."Djombodikilin"

Era uma vez …
Era uma vez na rua Porto travou-se uma conversa amena entre a mãe e o filho.
– Bem! Será que tu pensas? – perguntou a mãe ao filho de seis aninhos.
– Claro que penso? – respondeu o filho
– Mas o que é que tu pensas? – indagou a mãe curiosa para partilhar do pensamento do filho
– Penso se amanhecerei vivo e, ou se haverá de comer – respondeu o filho sem muito meditar.

Realmente o menino pensa. Que brilhante pensamento de uma crança de seis aninhos de idade. Este é dos primitivos racciocínios do Homem e nem toda a criança assim pensa.

Na sequência do dito diálogo deprendia-se o seguinte, aliás é a vez do filho questionar a mamãe.

– Mas mãe, porque é que tu sempre me pressiones a ir à escola? Será que na escola dão a gente sacos de arroz ou dinheiro? – perguntou o filho à mãe.
– Sim, tu não sabes disso? – respondeu a mãe interrogando.
– Não. Não sei.
– Na escola te dão tudo. Saco de arroz, dinheiro, bom trabalho, mulher, carro. Mas tudo mesmo.
– Mamãe! Mas tu não andaste na escola. E, então como é que de tudo isso sabes? – interrogou o pequeno – Eu não vi ningém que da escola recebeu arroz e dinheiro – continuou ele.
– Olha se andares na escola vais ser doutor, engenheiro ou especialista. Sendo um formado vais ter um bom emprego, uma casa linda, carros, mulher amada e filhos, resumindo vais ter um boa vida.

A puéril questão como de tudo isso sabes se na escola não andaste, encheu o olhar da Dona Tite de lágrimas.

– Sim, não andei na escola. – deu uma pausa, contendo as gotas que temem a chover do céu dos olhos p’ra depois continuar. – É uma longa e dolorosa estória. Olha o meu pai andou na escola, ele fez a quarta classe colonial, foi lavrador, carpinteiro, foi uma pessoa de bem naquela altura. Através dos familiares sabiávamos que tínhamos uma conta que não se sabe-se o paradeiro no banco. Éramos quatro duas fémeas e dois machos das duas mães amigas e «kumbosas» [1]. Cada mulher um filho e uma filha.
Já muito doente o papai deixou ou indicações ou testamento que filho p’ra que familiar deve ir na «kriason» [2].
Eu calhei–me à um familiar paterno à uma tia que mandava na escola os filhos dela e meus irmãos de criação por estes terem os pais vivos e, entretanto a mim reservava os afazéres domésticos. Supliquei–a que também queria andar na escola mas em vão. Dentre outras as minhas duras e puéris tarefas quotidianas se resumiam a cozinha, a costura, e «bida» [3] para ajudar com a mão em casa. Insónias, maltratos. Primeiro a acordar começando o dia com varrer, passar pano no chão, limpar e arrumar e, último a dormir depois de estender a cama, descer a tenda e apagar os candeiros. Lembro–me de episódios tristes como por exemplo de estar de pé quando almoçavam a mestra e o marido dele quer dizer era eu o último a almoçar. Assim como de muitas vezes que se esquecia de tirar a bácia de cama em mim é vazado o chichi alí contido.
Nem o meu cão desejo ver no criação. Por isso estude, trabalhe e progrida. Tudo faço e farei p’ra o teu bem – beijou o filho na testa e demoradamente abraçou–o.

FIM

Moscovo, Quarta-Feira, 22.02.2006 13h


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[1] Kumbosas – rivais, as mulheres de um homem
[2] Kriason – criação: educar criança alheia
[3] bida – vida, vendas; fazer bida – vender, fazer negócio


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FRASE & REFLEXAO

«Bida pa bida – negócio é negócio»
Guilhermina Da Silva

Manuel Pedro Pereira, Jr.
(Djombodikilin)
Moscovo, Quarta-Feira, 25.02.2006, 20 horas

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