Menina do Fim do Mundo
de olhos castanhos e profundos
gatos no telhado embriagados
celebram em serenatas a tua beleza
Rouxinóis no pinheiro de madrugada
cantam a nobreza da tua feição
a natureza te concebeu imitando
o carvão da lenha queimada em Geta
A escrita do teu corpo - meta da ficção
andar senhorial seleccionando a terra
a sinfonia do teu calcanhar -
a magia da tracção a romper
o ventre ferraz do solo
Campas de ervas mortas
as minhocas veneram a tua moleza
tchintchor na tribuna: - seca era!
Menina do fim do mundo de olhos
castanhos cântaros de água doce
rendido em gleba brota em mim
rosas vermelhas e em fevereiro
faço anos e acordo no teu jardim
na esquina da rua catorze creio
para que tu me acolhas no teu bouquet
para que ao entardecer o aroma que murcha
entre as corolas de malmequer e jasmim
espraie no teu sonho o limbo
do meu suspirar vetusto
no São-Valentim ao longo da soirée
Adão Quadé 27.04.05



3 comentários:
A menina do fim de mundo
guardada dentro dum coração
com sentimentos de fidalgo de Pelundo.
Força meu tutor!
Que belo poema! "Menina do fim do Mundo" é um texto sensível e cheio de imagens poéticas muito marcantes. Ele evoca uma atmosfera nostálgica, sensual e carinhosa para descrever a figura dessa menina, que é ao mesmo tempo musa, inspiração e elemento da própria natureza.
Aqui estão algumas possíveis interpretações e comentários sobre o poema:
**1. Paisagem e origem**
- O poema começa posicionando a "Menina do fim do Mundo”, sugerindo não só um local longínquo e misterioso, mas também evocando algo precioso e raro.
- Os olhos castanhos e profundos da menina são centrais, com a natureza (gatos, rouxinóis, floresta, lenha) celebrando e reconhecendo sua beleza.
**2. Metáforas e referências**
- Várias imagens são criadas: gatos embriagados, encantações de rouxinóis, as marcas do corpo.
- A "escrita do teu corpo", o "andar senhorial", o “calcanhar” e o “ventre ferraz do solo” são imagens que somam sensualidade, mistério e ligação à terra (talvez uma forte relação com as raízes do local ou do próprio “fim do mundo”).
**3. Dualidade vida/morte**
- “Campas de ervas mortas" e "minhocas veneram a tua moleza”, sugerindo que da morte também brota renovação, fertilidade, numa adoração do ciclo vital.
**4. Amor e desejo**
- O eu lírico posiciona-se como parte do ciclo natural — "rendido em gleba brota em mim / rosas vermelhas", e a lembrança do aniversário em fevereiro sugere um reencontro consigo e com ela em ocasiões marcantes.
- O desejo de acolhida no bouquet, na companhia da menina, reforça um anseio de pertença.
**5. Elementos de cultura e espaço**
- "Tchintchor na tribuna" pode ser uma referência a uma voz tradicional ou a uma expressão local. "Geta", "rua catorze", cheiros de flores tropicais e festas como “São-Valentim” evocam um ambiente lusófono, provavelmente africano (Guiné-Bissau, para onde Adão Quadé remete).
**6. Temporalidade e memória**
- O tempo é evocado: fevereiro (mês do aniversário do eu lírico), o entardecer, a soirée. Tudo remete a reminiscência, passagem do tempo e esperança de acolhimento amoroso.
**Conclusão**
O poema mistura desejo, memória, paisagem e profunda admiração, utilizando elementos sensoriais, aromas, sons e a própria terra como uma ode à "menina do fim do mundo".
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