quarta-feira, agosto 01, 2018

Menina do fim do Mundo



Menina do Fim do Mundo
de olhos castanhos e profundos
gatos no telhado embriagados
celebram em serenatas a tua beleza

Rouxinóis no pinheiro de madrugada

cantam a nobreza da tua feição
a natureza te concebeu imitando
o carvão da lenha queimada em Geta

A escrita do teu corpo - meta da ficção

andar senhorial seleccionando a terra
a sinfonia do teu calcanhar - 
a magia da tracção a romper
o ventre ferraz do solo

Campas de ervas mortas

as minhocas veneram a tua moleza
tchintchor na tribuna: - seca era!

Menina do fim do mundo de olhos

castanhos cântaros de água doce
rendido em gleba brota em mim
rosas vermelhas e em fevereiro
faço anos e acordo no teu jardim
na esquina da rua catorze creio

para que tu me acolhas no teu bouquet

para que ao entardecer o aroma que murcha
entre as corolas de malmequer e jasmim
espraie no teu sonho o limbo
do meu suspirar vetusto
no São-Valentim ao longo da soirée

Adão Quadé 27.04.05

3 comentários:

allende samori fernandes quadé disse...

A menina do fim de mundo
guardada dentro dum coração
com sentimentos de fidalgo de Pelundo.

Unknown disse...

Força meu tutor!

Ndongle Akudeta disse...


Que belo poema! "Menina do fim do Mundo" é um texto sensível e cheio de imagens poéticas muito marcantes. Ele evoca uma atmosfera nostálgica, sensual e carinhosa para descrever a figura dessa menina, que é ao mesmo tempo musa, inspiração e elemento da própria natureza.

Aqui estão algumas possíveis interpretações e comentários sobre o poema:

**1. Paisagem e origem**
- O poema começa posicionando a "Menina do fim do Mundo”, sugerindo não só um local longínquo e misterioso, mas também evocando algo precioso e raro.
- Os olhos castanhos e profundos da menina são centrais, com a natureza (gatos, rouxinóis, floresta, lenha) celebrando e reconhecendo sua beleza.

**2. Metáforas e referências**
- Várias imagens são criadas: gatos embriagados, encantações de rouxinóis, as marcas do corpo.
- A "escrita do teu corpo", o "andar senhorial", o “calcanhar” e o “ventre ferraz do solo” são imagens que somam sensualidade, mistério e ligação à terra (talvez uma forte relação com as raízes do local ou do próprio “fim do mundo”).

**3. Dualidade vida/morte**
- “Campas de ervas mortas" e "minhocas veneram a tua moleza”, sugerindo que da morte também brota renovação, fertilidade, numa adoração do ciclo vital.

**4. Amor e desejo**
- O eu lírico posiciona-se como parte do ciclo natural — "rendido em gleba brota em mim / rosas vermelhas", e a lembrança do aniversário em fevereiro sugere um reencontro consigo e com ela em ocasiões marcantes.
- O desejo de acolhida no bouquet, na companhia da menina, reforça um anseio de pertença.

**5. Elementos de cultura e espaço**
- "Tchintchor na tribuna" pode ser uma referência a uma voz tradicional ou a uma expressão local. "Geta", "rua catorze", cheiros de flores tropicais e festas como “São-Valentim” evocam um ambiente lusófono, provavelmente africano (Guiné-Bissau, para onde Adão Quadé remete).

**6. Temporalidade e memória**
- O tempo é evocado: fevereiro (mês do aniversário do eu lírico), o entardecer, a soirée. Tudo remete a reminiscência, passagem do tempo e esperança de acolhimento amoroso.

**Conclusão**
O poema mistura desejo, memória, paisagem e profunda admiração, utilizando elementos sensoriais, aromas, sons e a própria terra como uma ode à "menina do fim do mundo".