Sinais de paz?
Todos esperamos que sim, mas ninguém já consegue acreditar. Esta guerra começa a ser como aquela nossa brincadeira de criança: pôde-bem. Sabem que no final, no momento da padjigada, depois do Nhenku-Nhenku e do Tchitchori tchori iaia Ndé Kandému Ntalas (Ndulé-Ndulé), no memento da padjigada ninguém quer ficar com o mentu do outro. O grande problema desta guerra agora é Kim ku na fika ku mentu, porque depois canta-se o kurus-karas karessu. Ora designa-se assim kim ku pirdi. Meu Deus, consideremos que ninguém perdeu para não perdermos mais do que ja perdemos todos. Quem ganharia? O povo, senão: perderemos a única coisa que temos e que nos junta: a Guiné.
Eram cinco horas da manhã, mais uma vez levei o batalhão de familiares para o nosso abrigo. Vamos no quarto dia de guerra e, o dia de ontem foi particularmente violento. Mas, Alinu-li na mentu ntidu ku balas surua Bandé trás, Kiliquir dianti Nô firma suma nô matchundadi na defesa di sigridu di barraka.
Eram cinco horas da manhã, mais uma vez levei o batalhão de familiares para o nosso abrigo. Vamos no quarto dia de guerra e, o dia de ontem foi particularmente violento. Mas, Alinu-li na mentu ntidu ku balas surua Bandé trás, Kiliquir dianti Nô firma suma nô matchundadi na defesa di sigridu di barraka.
Ali élis li é na Ndjata ka na retourner
É ka kunsi nin Kankuran nin Ussai Plek
Kada kim kada Ndjol kada Ndjai arnegu di élis
Ma é ka tissi nin fuka nin bissap
Arma na kosta pa montia Republika rebelde
Ala é na bai fidjus di Ndjai Té kuma Ndjai Djú
Korda di lantcha na rabada / Kanela seku / Kabelu
kuma bosta di kabra
Arnegu di Djop ia Ussalanka
Lutu di Brá I ka tchiga fidi Lifanti
Binhalé um Djamba na Polon bu Fogantal na Puntu Sibi
Montiaduris nhominca salta na Djiba I djunki na Nghala
Alinu li ku elis suma tap ku bangadje
Ronku I ku elis / Ma badju di Brá I djambadon
Guer lambés na toka sikó Djamba na badja kafé kinti
Alinu li Na kassabi di P'Nghana
Kada familia I um stera di tchur
Kada surua I um fora di nós ku na padjiga dur na Pátria
Ali é nega far kussa di bai kuma Bissau mela tchut
Arma na pontada / Lunetas suma di Bubu Na Tchut
Ali élis li é na sussa lensolis di Pátria
É na sibi riba ku bás / Suma djintis ku bin nan Ten Tchon
Alinu li ku returnez na totis
Albés ku fomi albés ku sedi / Pontada kumpridu ma é nega bai
Ali élis li é na kunfundi M'Pandja ku Psak
É na buska Repúblika pa montia
Alinu li nô firma tcham suma nô matchundadi Pó di Sangui
Certeza na kabeça / Amanhã suma farol dianti
Esperança na pitu/Nô n'dianta ku nó terra
pabia di amanhá djitu ten na glória di Brá
Sinais de paz?
Talvez agora!
São cerca das três da tarde. Os tiros são menos frequentes. Estarão os soldados almoçando até a esta hora ou a amplitude da carnificina conseguiu finalmente humanizar os beligerantes? De repente a rádio nacional que durante todos estes dias propagava que só haveria trevas quando uma das partes se rendesse, anuncia a chegada de uma delegação togolesa para negociar um cessar-fogo. O que é que se passa? Perguntei-me a mim mesmo. Há poucos tinha falado com alguns diplomatas da troika facilitante que desde ontem tentam em vão obter uma audiência com o Presidente. De tempos em tempos ainda soam disparos de canhão nas zonas de Bandim e de Pessube/Bissak.
A notícia de uma trégua que poderia transformar-se num cessar fogo é anunciada pela rádio nacional, que desde logo acusa a Junta de não estar a respeitar esse acordo de cavalheiro, à espera de um acordo definitivo a ser negociado com as partes pela delegação do Togo. As crianças saíram logo dos bunkers e encheram as ruas de alegria, jogando à bola ou livrando-se em, pequenos grupos, a grandes "passadas". Falam do Estin muri, da casa do Fulano arrebentado pela bomba, Beltrano cobardolas que não ousava piar mesmo dentro do bunker e do sicrano "mancebu" que mesmo sob as bombas tinha tempo de andar aos engates.
Ivone não acredita que a vinda dos togoleses possa trazer rapidamente a paz. "Mbé, manera ku é na ameaça Nghutru sin, N ka fia". Mas dentro dela mesma, mais do que todas as outras ela almejava uma paz imediata. Mais uma vez o seu marido Ntoni está ausente quando Bissau é arrebatada pela guerra. Não vão as pessoas pensar que Ntoni sabe das coisas dos militares, porque desde que deixou a tropa colonial e arranjou um taxi, depois um bar e depois um camião e, depois, uma ponta e uma bela casa nos lados de poilão de Brá, ele não frequenta gente de arma. É que Ntoni, filho de Albino é um homem atarefado. Como se diz, quase um homem de negócio. O negócio de Ntoni não é arma, mas coisas da terra, do debaixo da terra, como madioca, batata, cajú, manga, americanos, ANAG, Canchungo, Paris, etc… Ele nunca está em casa. Passa mais tempo nas ondas da rádio. A mulher se queixa, mas "Ntoni ka ta menda", por isso, quando começa a guerra e "ka ta mati".
"Disgustu di Katchur I kontentamenti di lubu". Tino não sai muito estes dias. Pior, ele, herói de todas as guerras, famoso pelo desprezo dos abrigos, agora cola com a mulher no bunker da casa do Só Rachid. É que as bombas da Junta chovem agora caindo por tudo quanto é sítio. Ontem caiu na Farmedi, ao pé da Fortaleza de Amura, e matou imediatamente seis pessoas, entre as quais a filha do falecido Comandante da Marinha, Filipe, que morreu juntamente com Feliciano Gomes no início do mês de Agosto. A irmã mais velha de Paulo Silva morreu nesse mesmo sítio e na mesma altura, vítima de um fulminante ataque cardíaco. Chegam notícias de que a casa do João Blacken foi atingida duas vezes. O palácio também teria sido várias vezes alvejado, dizia alguém no bunker. E, parece que as bombas estão sendo dirigidas - diz alguém citando serviços de segurança. Passaram com Jonatas no carro - retorquiu um companheiro. Qual Jonatas? O irmão do You, Helder Proênça. Mas Jonatas está doente de cabeça! Doente nem sabe se há bombas e nem onde caem. Vieram buscar o Pumpo. Mbé, o que é que se passa ? Parece que os homens fardados que o vieram buscar disseram que por causa dele as bombas não caíam no Chão de Papel. Mas Pumpu di Tio Inácio de Alvarenga não faz feitiços - respondeu um vizinho dele, neto de Gã da Silva. Alguém gritou: "Ah si na tempu ba di Tia Orélia Ndjai, nada di és ka ta sedu. Vamos avisar a Liga." Aí vão eles correndo para a casa do Valdo enquanto que, numa Toyota branca, Pumpo, ladeado por dois capacetes de ferro no banco traseiro, viajava para sítio incerto. "Anta kau fenhi" - murmuraram os presentes incrédulos, pelo que viam e pelo que ouviam na rádio. "Anta kau fenhi".
E a paz ainda não tinha chegado às nossas casas. Pelo contrário, chegavam notícias de prisões de gente acusada de estar a dirigir tiros da Junta. Soavam incessantemente estrondos por tudo quanto é canto da Capital.
"É stá dja na Chapa. É na ientra é dinoti". Cada um "cuava as suas nobas" que mais não eram do que desejos pessoais de ver o conflito um desfecho rápido. Nos bunkers como nas rádios muitos são os que preconizam a solução final. Estes certamente não foram ao hospital ver cadáveres irreconhecíveis, sem cabeça, sem membros, cortados ao meio. Para ver crianças feridas e que perderam todos os membros da sua família. Esses apologistas não viram Ntumbo endoidecido pelos estrondos a dançar na estrada ao ritmo das balas. Não. Não viram nada. Uns defendem o que têm, enquanto que os outros lutam por aquilo que esperam alcançar. Por isso a claque irracional reclama uma guerra fratricida até a vitória final.
Finalmente, pela voz do Ministro de Iadema, os guineenses tomam conhecimento do novo acordo de cessar fogo, lido nas ondas da Rádio Nacional. A Junta mantém-se silenciosa. As suas emissões estão quase completamente cobertas pela Rádio Nacional. O texto não diz nada senão cessar-fogo e facilitação do desdobramento imediato das tropas da Ecomog. Cadé o problema das tropas estrangeiras? O que terá acontecido com a Junta? Quando é que vão reagir? Terá acontecido alguma coisa ao Zamora ou a algum destacado dirigente do movimento? Porque é que ele não fala desde Domingo? Deus é grande!
Esperemos que este acordo não venha a significar caminho aberto à perseguição interna, nomeadamente dos amigos da Junta da rua dez, como se diz na Rádio Nacional. E a noite vai caindo com o silêncio da Junta, com a prisão do Pumpo, mas com uma paz anunciada. As bombas continuam, mas cada vez mais ao longe, nas zonas de Plaque, de Bissak e de Enterramento.
Bissau, 3 de Fevereiro de 1999.
H M
A notícia de uma trégua que poderia transformar-se num cessar fogo é anunciada pela rádio nacional, que desde logo acusa a Junta de não estar a respeitar esse acordo de cavalheiro, à espera de um acordo definitivo a ser negociado com as partes pela delegação do Togo. As crianças saíram logo dos bunkers e encheram as ruas de alegria, jogando à bola ou livrando-se em, pequenos grupos, a grandes "passadas". Falam do Estin muri, da casa do Fulano arrebentado pela bomba, Beltrano cobardolas que não ousava piar mesmo dentro do bunker e do sicrano "mancebu" que mesmo sob as bombas tinha tempo de andar aos engates.
Ivone não acredita que a vinda dos togoleses possa trazer rapidamente a paz. "Mbé, manera ku é na ameaça Nghutru sin, N ka fia". Mas dentro dela mesma, mais do que todas as outras ela almejava uma paz imediata. Mais uma vez o seu marido Ntoni está ausente quando Bissau é arrebatada pela guerra. Não vão as pessoas pensar que Ntoni sabe das coisas dos militares, porque desde que deixou a tropa colonial e arranjou um taxi, depois um bar e depois um camião e, depois, uma ponta e uma bela casa nos lados de poilão de Brá, ele não frequenta gente de arma. É que Ntoni, filho de Albino é um homem atarefado. Como se diz, quase um homem de negócio. O negócio de Ntoni não é arma, mas coisas da terra, do debaixo da terra, como madioca, batata, cajú, manga, americanos, ANAG, Canchungo, Paris, etc… Ele nunca está em casa. Passa mais tempo nas ondas da rádio. A mulher se queixa, mas "Ntoni ka ta menda", por isso, quando começa a guerra e "ka ta mati".
"Disgustu di Katchur I kontentamenti di lubu". Tino não sai muito estes dias. Pior, ele, herói de todas as guerras, famoso pelo desprezo dos abrigos, agora cola com a mulher no bunker da casa do Só Rachid. É que as bombas da Junta chovem agora caindo por tudo quanto é sítio. Ontem caiu na Farmedi, ao pé da Fortaleza de Amura, e matou imediatamente seis pessoas, entre as quais a filha do falecido Comandante da Marinha, Filipe, que morreu juntamente com Feliciano Gomes no início do mês de Agosto. A irmã mais velha de Paulo Silva morreu nesse mesmo sítio e na mesma altura, vítima de um fulminante ataque cardíaco. Chegam notícias de que a casa do João Blacken foi atingida duas vezes. O palácio também teria sido várias vezes alvejado, dizia alguém no bunker. E, parece que as bombas estão sendo dirigidas - diz alguém citando serviços de segurança. Passaram com Jonatas no carro - retorquiu um companheiro. Qual Jonatas? O irmão do You, Helder Proênça. Mas Jonatas está doente de cabeça! Doente nem sabe se há bombas e nem onde caem. Vieram buscar o Pumpo. Mbé, o que é que se passa ? Parece que os homens fardados que o vieram buscar disseram que por causa dele as bombas não caíam no Chão de Papel. Mas Pumpu di Tio Inácio de Alvarenga não faz feitiços - respondeu um vizinho dele, neto de Gã da Silva. Alguém gritou: "Ah si na tempu ba di Tia Orélia Ndjai, nada di és ka ta sedu. Vamos avisar a Liga." Aí vão eles correndo para a casa do Valdo enquanto que, numa Toyota branca, Pumpo, ladeado por dois capacetes de ferro no banco traseiro, viajava para sítio incerto. "Anta kau fenhi" - murmuraram os presentes incrédulos, pelo que viam e pelo que ouviam na rádio. "Anta kau fenhi".
E a paz ainda não tinha chegado às nossas casas. Pelo contrário, chegavam notícias de prisões de gente acusada de estar a dirigir tiros da Junta. Soavam incessantemente estrondos por tudo quanto é canto da Capital.
"É stá dja na Chapa. É na ientra é dinoti". Cada um "cuava as suas nobas" que mais não eram do que desejos pessoais de ver o conflito um desfecho rápido. Nos bunkers como nas rádios muitos são os que preconizam a solução final. Estes certamente não foram ao hospital ver cadáveres irreconhecíveis, sem cabeça, sem membros, cortados ao meio. Para ver crianças feridas e que perderam todos os membros da sua família. Esses apologistas não viram Ntumbo endoidecido pelos estrondos a dançar na estrada ao ritmo das balas. Não. Não viram nada. Uns defendem o que têm, enquanto que os outros lutam por aquilo que esperam alcançar. Por isso a claque irracional reclama uma guerra fratricida até a vitória final.
Finalmente, pela voz do Ministro de Iadema, os guineenses tomam conhecimento do novo acordo de cessar fogo, lido nas ondas da Rádio Nacional. A Junta mantém-se silenciosa. As suas emissões estão quase completamente cobertas pela Rádio Nacional. O texto não diz nada senão cessar-fogo e facilitação do desdobramento imediato das tropas da Ecomog. Cadé o problema das tropas estrangeiras? O que terá acontecido com a Junta? Quando é que vão reagir? Terá acontecido alguma coisa ao Zamora ou a algum destacado dirigente do movimento? Porque é que ele não fala desde Domingo? Deus é grande!
Esperemos que este acordo não venha a significar caminho aberto à perseguição interna, nomeadamente dos amigos da Junta da rua dez, como se diz na Rádio Nacional. E a noite vai caindo com o silêncio da Junta, com a prisão do Pumpo, mas com uma paz anunciada. As bombas continuam, mas cada vez mais ao longe, nas zonas de Plaque, de Bissak e de Enterramento.
Bissau, 3 de Fevereiro de 1999.
H M
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