N tene un sunhu
kanfurbat pa bafa ku binhu
bo nghuninghuni...
ami dja n sta kontenti
paki n tene un sunhu...
n sunha terbesadu kuma
nha korson kamba mar
lungha labal ku si sukuma
tubaron dal buleia
disna ki tchiga djiu-di-reia
kudadi murtcha - ai i nor-nori!
na singadura di maron di l'bardadi
kin ku misti gera pa i bai tera
ku mundu misti padjiga sin bardadi
ami dja... ampus!
n tene un sunhu
Ndongle Akudeta
2003
Sonho contemplado
( adaptado do kriol)
a acompanhar com o vinho
na tasca do tagarelice
serve-se de mim em bandeja
para petisco e gira-disco
eu por cá estou feliz
por ter tido um sonho
sonho avesso em diagonal
alma na travessia atlântica
banhada com a espuma da lua
naveguei no leque do tubarão
e o corpo jaz no ilhéu d' areia
pensar amarfanhado no divagar amorfo
na embriaguez das ondas do libertar
duelo esgrime-se na arena da barbárie
nas praças lavra-se a verdade em série
e eu nesta cabana do pescador
na ternura do descanso na preia-mar
contemplo a fortuna emérita do sonhar
2003
Essa vida
escalvada
em que tudo
se permuta
por as vozes
serem mudas...
tantas nozes
caíram em vão
ervas
sem luzes
gritando
na escuridão
o silêncio
do betão
sentenciou a morte
ombros
sem suporte
branqueando a razão
nunca
fui mestre
no meu nobre ofício
sustento
com desastre
os vícios do novício
esta súcia idade
cuja cor do mérito
é a dor do pretérito
duende
da sociedade
tosse convulsa
ulcera-me
a pulsação
canto de revolta
encharca-me
o coração
pese
tanta avaria
nas ondas do mar -
pássaro
gigante
sem norte
no sol-pôr
gélido
volitando
asas de vela
derretendo
na mordaça
do vendaval
da servilidade -
na luz solene
da madrugada
confesso
às ignotas nuvens
a mais-valia
e conchego
o brio do recolher ao ninho
Adão Quadé
Verão 2002
Palpitação
a ânsia de esperar
morre assim de repente
em qualquer momento
quando impacientemente
esperamos por um cliente
debaixo deste monumento
petrificado sem movimento
o ponteiro certeiro do tempo
rolou inteiro ao longo do templo
para lá do muro do desespero
onde por delíquio jaz o destempo
num gesto de vaivém espero
que me levem ao desterro
gotas tristes da palpitação
Adão Quadé
Oriente.19.12.03
21:30
Imperfeição (Vicivs)
quem me beliscar as chagas
as minhas costas chicotear
o meu desconforto endireitar
e amansar as turbulentas cócegas?
quem?
permanente infecção
carente de enfermeiro
no leito da perfeição
manuseio do ferreiro
experimentando em maço
me amassando em pedaços
atrapalho o que faço em passos
e me desfaço no espaço
aclamo-vos clementemente
libertando-me deste meu ser cretino
cá tenho a correcta chibata
quem quer me chicotear !?
Adão Quadé
Viseu, Sábado, 27.01.2001
Visão Lúgubre
Deslumbrante
achei-me
nas tuas artérias
subo e desço
inerte
deixei-me embalar
ao calor
que verte de sorte
na delícia do teu manto
mortalha
do meu pensamento
pesadelo...
sentir-se só
a rir
bombolom
do holocausto
em balões de ar fausto
alegria
amálgama vestir
um dia
albatroz a voar
fez em mim
fúnebre
pousada
santuário cavernoso
do seu ritual satânico
alado
- coitado do pobre
mancebo imberbe!
Adão Quadé
Lisboa, 2001
Impressões em cloro
Adoro tudo o que as pessoas gostam
Tenho comigo cábulas - impressões em cloro
De todas as articulações que no ar baloiçam
Em tons vivos perpetuadas num limbo inodoro
No histórico Museu de Sons
Tenho registo directo de todos os barulhos
E murmúrios do tempo em miniatura
Do que eu gosto na verdade
(Gestos mergulhados na areia
Podando os descontínuos movimentos
Suspensos no tronco de um velho pinheiro louco)
Espero logo que tenha causado desânimo aos adeptos impávidos
Sou fanático antes de mais dos meus fãs fantásticos
22.08.03
Adão Quadé
Estefânia, casa do Tote
Mon di parmanha
Si bu tene djanta
Pake purkupa
Ku matabitchu
Bicthu ku tene bida
Gargadjada si sol ku raganha
Ta pruntial murtadja
Ma si mundu di kabasera
ten diparmanha
Ka bu disal i firia
Antu di sol na mer-meri
Kumpul kurpu ku djitu
Kil ku na sedu pa i sedu
Ma na konsens ku rispitu
Ndongle Akudeta
28.08.03
Lisboa,16:25
Café da manhã
Almoça-se um tiro
Após um longo retiro
Deixa-se para as crianças
As fatias de pão do mata-bicho
Bicho que persiste no âmago
O sorriso hilariante
Do sol nascente
Embalsama a sua mortalha
Não se desperdiça
O quinhão da manhã
Se da cozinha o cheiro
É prateado de cabaceira
Com gestos de artesão
Comei até lamber a mão
E com toda a arte do peito
Antes do dia reclamar - mas com jeito
Haja consenso e o respeito
E esperemos pelo resultado
Barca de papel (para ti)
Tu és o papel branco
Com que escrevo à caneta azul
Um barco à vela em pleno calor
Visto por um mergulhador
Assino: Sanuíra Juelsa Ferreira Costa
Pelicano perdido na encosta
Improviso uma linda letra para ti, Amor
Com caracteres teatral e tépido e tímido mas tenro
Letras dóceis e mansas como o teu calor
Desta feita sinto-me invadido pelo teu desejo
E nesta nuvem sobre a neve fabrico o teu beijo
Estou pálido como nunca a arrefecer
Da frieza sombria da tua volúpia
Que me conduz ao longo da caminhada matinal
Acordo constipado com febre cor da melancolia
Não sei se te amo como penso imaginando
E se tu de igual forma o abraças...
Unamos os nossos sonhos construamos uma barca
Que tal um cruzeiro ao mar fora planejarmos
Sem lágrimas porque a vela estará acesa
Nas linhas convencionais que o teu sonho abarca!
Adão Quade
Bissau 08.Out.2000 -
Viseu 28.Maio.2001(02:30)
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